"A palavra não foi feita para enfeitar, brilhar como ouro falso; a palavra foi feita para dizer."

(Graciliano Ramos)



sexta-feira, 20 de julho de 2012

Mangaratiba - Santos: Relato de um andarilho

Segue abaixo as palavras do amigo Jaba sobre a viagem realizada entre os dias 2 e 13 de julho, onde percorremos a BR-101, saindo de Mangaratiba até Santos.

Ao iniciar estas linhas estou realizado e feliz, pergunto-me: Como eu um brasileiro que com tantas adversidades ao seu redor consegue sentir-se desta forma? Roubo, jogadas politicas, fome, descaso da saúde, educação mínima, falsas promessas entre outras mais situações fazem parte do nosso cotidiano. No entanto quando olho para o lado e vejo a minha princesa (que me perdoe a Cláudia), mas a princesa referida neste momento é aquela que com simples duas rodas faz com que o meu mundo fique acima de qualquer situação. Não que ela exerça uma força física / espiritual ou dominadora, mas é ela que me leva a lugares extraordinários, a devaneios interiores que difícil ficam de defini-los.
Às vezes penso em trocá-la, e simplesmente ela me faz sentir-me culpado; mas porquê a troca? Eu estou aqui, te levo para onde queres ir, te faço sonhar, te faço sorrir, ter faço empurrar, te faço chorar (sentimento nobre), te mostro que a vida é linda e muito curta, te mostro o quanto somos mesquinhos, te mostro que não precisamos de muita coisa para viver, te mostro o seu caminho interior, te mostro este baita mundão maravilhoso e que estamos destruindo e não o aproveitando.
Pedaleiros, este caráter introdutório acima, é um relato humilde na forma de homenagear não a bicicleta como um ser ou um material metálico, mas sim aqueles que como eu, através da mesma conseguiu transpor para um lado mais humano. A definição de “Andarilho” em minha cidade é designada para aqueles (a qual estou incluído) que não possuem alguma bike de ponta ou extraordinária; não sou contra quem possui as máquinas maravilhosas, simplesmente respeito o desejo e as condições de cada um.
Quando falo que vou pedalar, familiares e amigos comentam: “Lá vem ele de novo, o que será que este louco está preparando desta vez?” Todo mundo de cabelo em pé. Neste momento não me entrego e lembro-me do antigo conjunto musical “Os Mutantes”, em sua música Balada de um Louco, que na voz da nossa Rita Lee dizia:
Sim! Sou muito louco
Não vou me curar
Já não sou o único
Que encontrou a paz
Mas louco é quem me diz!
E não é feliz!
Eu sou feliz!...

Deixando a prosa de lado, na primeira quinzena de julho de 2012, fiz uma viagem de cicloturismo na rota Mangaratiba – Santos. Eu, JABA um cardíaco controlado, mas um pedaleiro de alma incontrolada; Cacau, que considero um lider consensual. Um apaixonado pela bike; Vaninho, um louco em fuga e neste caso, acredito que está fugindo é dele mesmo.
Quando estas três almas se juntaram, tenho certeza que as nossas princesas das rodas imaginaram: onde fomos nos meter! Por que fornecemos as estes malucos a liberdade do pedal?
Abaixo segue alguns fatos pitorescos:

Mangaratiba / Ilha Grande
1. Motorista do buzão foi até Mangaratiba por nossa causa, pois não havia mais passageiro, um mau-humor terrível, mas depois abriu a guarda pois não tinha outro jeito e nada iria nos tirar do sério; (Mas não deixou de lado a sua impertinência dizendo que não havia ninguém em Mangaratiba e que era mentira da recepcionista de que o hotel estava cheio só para nos cobrar mais caro...talvez estivesse até com razão.)

2. Paulo, um nativo que com sua bike nos guiou e deu informações sobre as pousadas, senti que o mesmo estava nos admirando com aquela aventura;

3. Cacau colocou o relógio para despertar às 3:40 da madruga, devido ao seu trabalho de turno na Petrobrás. Detalhe: só percebeu isto depois de roupa mudada para pedalar, praticamente estava pronto; (E Vaninho sentado na beirada da cama olhando com ar aparvalhado, sem nada entender.)

4. As trilhas escolhidas em Ilha Grande não davam acesso a bike e, embora todos nos avisassem, seguimos em frente, consequência: Carregamos e empurramos na maiorias das vezes as nossas princesas; (Teimosia característica de trilheiro.)
5. O Baiano, filho de cigano e nascido no Paraná, vai entender isto. Dono de um restaurante (acredito que era de sua companheira) onde almoçamos, exibindo a sua maior glória: Todos os seus dentes superiores eram de ouro; (Implantados em Porto Seguro, dizia ele, com orgulho)

6. A volta da ilha para Mangaratiba foi surpreendente, pois era lua cheia e foi um momento único observar aquele mar ao fundo a lua sob as ilhotas com um reflexo prateado nas águas, lembro-me do Zé Ramalho na sua melodia Beira Mar capítulo 2:
Quando o dia morre e a noite avança
A brisa marinha bafeja e murmura
Nos braços divinos da santa natura
A noite soturna tristonha descansa
O mundo adormece e o mar se balança
A lua de prata começa a brilhar
Jogando reflexos dourados no ar
Rasgando o véu preto que envolve o espaço
Matando a metade do grande mormaço
Que agita as procelas na beira do mar.

Nossa! É indescritível esta cena. Só uma bicicleta, na sua simplicidade, para me proporcionar tal situação e fazer-me sentir muito leve. Naquele momento, praticamente flutuava.





Angra dos Reis
Nos hospedamos em uma pousada na Praia Grande, um local acolhedor e calmo para aquele momento, não resisti e fui ao mar. Que delícia! Embora a água estivesse gelada, o meu interior ficou bastante grato e relaxado. Cacau me acompanhou, mas Vaninho não. Acho que não é chegado a uma água gelada.
No final da tarde, fiquei contemplando aquele cenário paradisíaco, com o mar sereno, muitas embarcações de lazer ancoradas, lembrei-me da Cláudia, de meus país e irmãos e agradeci ao meu Deus por esta chance, quantos não desejariam estar nesta situação? Não do bem prazer material, mas sim do bem estar interior, de estar em paz consigo mesmo, de sua paz de espírito. Olhei para o lado e lá estava a minha princesa, não me contive e fiz um carinho na mesma (Não estou louco, ainda.)







Paraty
Nos hospedamos em uma pousada na qual o dono era meio Surdo, Hipertenso, Diabético, Agitado, Estressado e no fundo Louco (Mais que o Vaninho). Esta pousada esta situada a 30 km de Paraty, no distrito de Mambucaba antigo Perequê e pertence a Angra. De lá ficou mais viável (R$) a nossa logística para Paraty e visitar a Flip. (Na verdade, quando foi feito o planejamento da viagem, não foi levado em consideração a Feira. Foi puro acaso encontra-la em nosso caminho.)


Indo de Angra para Paraty encontramos  essa figura, Alex., indo em direção oposta. Ao ser perguntado para onde ia  respondeu, simplesmente: "Para onde o nariz apontar."



Encontramos também com Raquel entre Paraty e Ubatuba, passeando de bike e, quando nos avistou, não resistiu e veio ao nosso encontro. Infelizmente precisávamos seguir viagem, não sem antes contarmos um pouco de história e batermos algumas fotos juntos.


Ubatuba
No sertão de Ubatumirim, participamos do festival da Mandioca além de presenciar a cultura musical do caiçara. Ficamos hospedados na praia do Estaleiro, uma bela enseada encravada entre a serra e o mar, espero que o progresso avassalador não acabe com este paraíso. Que bela praia, mais uma vez acaricio a princesa (por favor, estou sano).





Caraguatatuba
Participamos do festival da Tainha. A atendente tentou dar uma volta em Vaninho, mas de louco ele só tem aparência, então não aconteceu o fato. (Mais um festival em nosso caminho.)





São Sebastião / Ilhabela
Com toda sua beleza, a Ilhabela provocou um surto em um surtado. A bicicleta mostrou a Vaninho a dura realidade de classes sócias, embora sejamos todos iguais.








São  Sebastião-Bertioga, passando por Riviera São  Lourenço.
















Guarujá . Uma pena que estivesse chovendo. Mas, cicloturismo e isso aí .








Santos










Continuação do relato de Jaba...

Não foi preciso comprar nenhuma revista de turismo, pois vivenciei cada momento. Senti a brisa, senti o suor, senti o cansaço, mas do fundo do meu coração deixo aqui os meus agradecimentos: aos meus pais que no final me apoiaram e viveram comigo através de meus humildes relatos cada momento de felicidade; a Cláudia mesmo preocupada sempre me apoiando e mais, sem nenhuma mágoa ou ciúme da princesa; ao meu Deus que me  deu mais uma chance de ver que o mundo é  tão bonito e aos irmão do Pedal Cacau e Vaninho que souberam administrar as minha impertinências, falhas e tantas outras dificuldades que nos deparamos de caráter pessoal.
Considero a vida como uma viagem de trem, sempre estamos de estação para estação e a cada uma delas estaremos em mais um novo episódio. Aqui me despeço e aguarde que já estamos preparando mais uma surpresa para as nossas princesas, abaixo a tradução de uma melodia do Bob Dylan a qual muito me atrai:

Soprando Ao Vento (Blowin' In The Wind)
Quantas estradas um homem precisará andar
Antes que possam chamá-lo de homem?
Quantos mares uma pomba branca precisará sobrevoar
Antes que ela possa dormir na areia?
Sim, e quantas balas de canhão precisarão voar
Até serem para sempre banidas?


A resposta, meu amigo, está soprando ao vento
A resposta está soprando ao vento

Sim, e quantos anos uma montanha pode existir
Antes que ela seja dissolvida pelo mar?
Sim, e quantos anos algumas pessoas podem existir
Até que sejam permitidas a serem livres?
Sim, e quantas vezes um homem pode virar sua cabeça
E fingir que ele simplesmente não vê?

A resposta, meu amigo, está soprando ao vento
A resposta está soprando ao vento

Sim, e quantas vezes um homem precisará olhar para cima
Antes que ele possa ver o céu?
Sim, e quantas orelhas um homem precisará ter
Antes que ele possa ouvir as pessoas chorar?
Sim, e quantas mortes ele causará até saber
Que pessoas demais morreram?
A resposta, meu amigo, está soprando ao vento
A resposta está soprando ao vento

JABA, Campos dos Goytacazes – RJ

Assim nos despedimos de mais uma aventura...e já  pensando na próxima.
Um abraço.

Um comentário:

Shauan Bencks disse...

Olá sou Shauan Bencks, cicloturista iniciante de São Paulo.
Parabéns pelo relato e fotos, sensacionais.....
Vou ficar atento no blog e vou ler relatos anteriores..
Se quiserem me vistar eu estou no www.shauandebicicleta.wordpress.com

abraço